Uma Nova Teoria sobre o Desenvolvimento do Intestino Irritável

1. A teoria dominante sobre o desenvolvimento do síndroma do intestino irritável sustenta que os sintomas seriam causados pela especial sensibilidade dos nervos do tracto digestivo ou pelo modo como estes sinais seriam processados no cérebro. Durante períodos de stress emocional ou físico os sintomas tornar-se-iam mais incomodativos devido a “uma interacção estreita entre o cérebro e o intestino” cujo suporte estrutural não se conhece.

2. Surgiu, entretanto, uma outra hipótese proposta por Aguilera-Lizarraga (Nature, 2021): a interacção entre o sistema imunitário e o sistema nervoso entérico seria a causa dos sintomas. Este trabalho muito minucioso nos seus detalhes é resumido nas páginas no N. Eng J.Med por Marc Rothenberg.

Sabe-se que as gastroenterites infecciosas são um factor de risco para o intestino irritável sendo que muitos doentes com este quadro dizem que os seus sintomas surgiram após um acidente infeccioso agudo. Os autores acreditam que o aumento no número de mastócitos capazes de produzir mediadores neurotrópicos poderia estar envolvido na hipersensibilidade visceral.

Os mastócitos existem vários tecidos localizando-se na proximidade de vasos sanguíneos ou de fibras nervosas. Possuem receptores de alta afinidade para as IgE libertando mediadores se expostas a alérgenos. Acredita-se que certos alimentos em certos indivíduos poderiam induzir a produção local de IgE que desencadearia a cascata descrita. Se esta ideia tiver sentido então a abordagem terapêutica do intrestino iiritável terá que ser revista.

3. Os autores inocularam ratos com uma bactéria capaz de induzir uma infecção cólica ao mesmo tempo que alimentavam os referidos animais com albumina do ovo. Quando o quadro infeccioso desaparecia os animais recebiam de novo apenas a albumina do ovo. Os ratos tinham diarreia e contracções anormais dos músculos digestivos. Na mucosa do colon identificavam-se IgE dirigidas contra a referida albumina.

Se os animais apenas tivessem sido inoculados com a bactéria patogénica mas não recebessem albumina então não teriam uma reacção posterior à administração de albumina. Se a experiencia fosse efectuada com ratos modificados sem mastócitos ou sem receptores para a histamina a reacção seria também normal.

4. Esta mudança de paradigma na explicação do intestino irritável pode ter importantes consequências na abordagem terapêutica destes doentes. Em vez de se usarem espasmolíticos faria nesse bastante mais sensível utilizar medicamentos capazes de estabilizar os mastócitos digestivos.

Rothenberg, M.
Na allergic basis for abdominal pain
NEJM.2021.384.2156-8

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